terça-feira, 22 de julho de 2025

Festa do caqui no PL



 Eu segui o dinheiro do partido de Bolsonaro. Fui parar em Mogi das Cruzes, reduto eleitoral de Valdemar da Costa Neto.”.

Na semana passada, Cartas Marcadas revelou que o sócio de Eduardo Bolsonaro recebeu dinheiro público via fundo partidário. Como vocês gostaram, decidi continuar cavando no mesmo buraco. Posso garantir: o PL tem muito a esconder.


Só neste ano, mais de R$ 1 bilhão passará pelas mãos da legenda comandada por Valdemar da Costa Neto. Na prestação de contas do partido, encontrei mais um caso intrigante.


Se na edição anterior mostramos como o dinheiro público pode alimentar estratégias ideológicas e internacionais, agora é hora de olhar para dentro: há verbas que simplesmente voltam para onde tudo começou. Venha comigo até Mogi das Cruzes, a terra de Valdemar.

O PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, desembolsou ao menos R$ 364 mil para a produtora audiovisual Caqui Filmes Para Publicidade Ltda nos últimos dois anos. Os pagamentos foram feitos com recursos do fundo partidário – ou seja, com dinheiro público.


Os desembolsos chamaram minha atenção porque a Caqui Filmes não tem site oficial ou perfil em redes sociais – e porque, em maio deste ano, a empresa recebeu uma transferência bancária de R$ 184 mil em um único pagamento do Diretório Nacional do PL.


Fui atrás e, segundo os dados da Receita Federal, a empresa tem sede no bairro da Barra Funda, em São Paulo. Mas documentos obtidos por Cartas Marcadas revelam ligações da firma com Mogi das Cruzes, reduto eleitoral de Valdemar da Costa Neto.


Comprovantes de pagamentos extraídos pela reportagem direto do DivulgaSPCA, plataforma de transparência da Justiça Eleitoral, revelam que os valores desembolsados pelo partido foram parar em uma agência bancária mogiana – ainda que a sede da empresa seja na capital.

Uma das notas fiscais que indica o destino do dinheiro: agência de Mogi das Cruzes, em São Paulo | Reprodução.

O destino do dinheiro não é o único indício dos laços da Caqui Filmes com a terra de Valdemar. Certidões registradas na Junta Comercial de São Paulo, a Jucesp, são reveladoras sobre a trajetória da empresa até ser alçada a uma das principais fornecedoras do PL.


De acordo com os documentos, a Caqui Filmes foi fundada em 5 de julho de 2017, quando foi registrada como empresa individual em nome da profissional de gestão patrimonial Bruna Moreira Gomes, com sede no centro de… Mogi das Cruzes. O capital inicial declarado era de R$ 35 mil.

Em 2019, no entanto, a produtora passou por uma reformulação: Bruna deixou a sociedade, e o controle foi assumido pela comunicadora Marília Padija de Oliveira, que transferiu a sede para São Paulo, onde a empresa está registrada hoje, com capital social de R$ 100 mil.


Apesar de ter deixado formalmente a Caqui Filmes, Bruna segue no quadro societário de outras duas empresas sediadas em Mogi das Cruzes. Na primeira delas, a Azimute Gestão Patrimonial, com capital social de mais de R$ 10 milhões, divide as cotas com a advogada Lidiane Mancio, filha de um ex-vereador de Mogi das Cruzes.


Marília Padija, hoje sócia única da Caqui Filmes, também acumula laços com a cidade de Valdemar. Formada em Rádio e TV na Universidade de Mogi das Cruzes, a UMC, ela já trabalhou na RP Propaganda, uma agência mogiana que funcionou no município até 2019.


Cadê os vídeos?

O pagamento mais alto feito à Caqui Filmes – R$ 184 mil, em maio de 2025 – também é o mais opaco. A transferência foi realizada pelo diretório nacional do PL, que ainda não especificou, nos registros públicos, qual serviço foi prestado em troca do valor.


Não há nota fiscal associada à transação nas bases consultadas pela reportagem, tampouco detalhamento da peça audiovisual eventualmente produzida.


Já os documentos relativos aos pagamentos de 2023 registram que o objetivo da prestação de serviços foi a produção de três mini-documentários com exemplos de histórias reais de mulheres que “fazem acontecer” no PL, um vídeo para exibição no evento Agrishow 2023 e outro voltado ao público jovem.


Busquei no canal do YouTube e só encontrei dois dos cinco vídeos encomendados há dois anos. As duas peças, que custaram R$ 38 mil cada uma, têm menos de 3 minutos de duração.


Cartas Marcadas solicitou ao PL o envio dos links onde estão hospedados os vídeos contratados por meio de cada um dos pagamentos. A reportagem também entrou em contato com Bruna Gomes e Marília Padija, bem como com a Caqui Filmes, para questionar qual a relação da empresa com Valdemar. O presidente do PL também foi procurado.


Até o momento, não houve resposta. Se houver, será adicionada à versão do texto que será publicada no site do Intercept Brasil na próxima quarta-feira, 23.


Quem é Valdemar?

Para responder a essa pergunta, é essencial ler essa reportagem da revista Piauí publicada em 2024. O perfil revela como Valdemar transformou o PL em uma das máquinas mais eficientes da política nacional — gerindo um orçamento oriundo do Fundo Partidário que é superior ao de 98% dos municípios brasileiros.


O texto mostra também como Bolsonaro virou um ativo do partido: tem salário, assessores, advogados e até alimentação pagos pelo PL. Entre os deputados, o grupo mais próximo de Valdemar já é chamado de “PL do V”, expressão que sintetiza o poder pessoal que ele exerce sobre a legenda.


O boy de Mogi das Cruzes

O perfil assinado por Lauro Jardim em O Globo resgata a origem do apelido “Boy de Mogi das Cruzes”, herdado ainda jovem, quando iniciou a carreira política ao lado do pai, ex-prefeito da cidade. A reportagem relembra que Valdemar passou por cargos municipais, virou deputado federal e se tornou um dos principais articuladores do Centrão.


O trabalho ainda mostrou como, apesar dos escândalos, ele nunca perdeu o controle do PL — partido que usou para abrigar Lula em 2002 e Bolsonaro desde 2021.

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